O frigorífico Big Boi suspendeu temporariamente os abates em sua unidade localizada em Paiçandu, no noroeste do Paraná, confirmaram fontes consultadas pelo Valor. A empresa demitiu cerca de 800 funcionários. Procurada, a companhia negou a paralisação. “É fake news, estamos operando normalmente”, disse uma funcionária.
A Secretaria de Desenvolvimento Econômico do município, no entanto, confirmou a informação. Um membro da diretoria do frigorífico teria explicado que a suspensão das atividades é, a princípio, temporária.
“Parece que vão operar apenas como distribuidora, com um número menor de colaboradores, para não desativarem a planta totalmente. Tem a ver com instabilidade econômica e a necessidade de se fazer melhorias”, afirmou um interlocutor na Pasta.
Na cidade e também entre integrantes do segmento, comenta-se que a unidade paranaense da Big Boi vinha operando no vermelho desde meados do ano passado. O aperto deveu-se à tentativa da empresa de competir por matéria-prima com frigoríficos de outros Estados, que aumentaram o valor que oferecem pelos animais para garantir suprimentos. Paiçandu fica a pouco mais de 100 quilômetros do Estado de São Paulo, que concentra a maior parte dos frigoríficos habilitados para exportar à China. O Big Boi não tem habilitação para vender diretamente aos chineses, apenas para o território autônomo de Hong Kong.
Segundo Pedro Gonçalves, analista da Scot Consultoria, o preço médio (para exportação e também mercado interno) da arroba do boi é hoje de R$ 278 no noroeste do Paraná e de R$ 273 em São Paulo. Um ano atrás, as posições estavam invertidas: a arroba era mais cara em São Paulo (R$ 330) do que no noroeste paranaense (R$ 318).
A paralisação dos abates na unidade do Big Boi no município de Paiçandu é quase a crônica de uma morte anunciada, diz o pecuarista Ricardo Rezende, ex-diretor da Sociedade Rural do Paraná (SRP). Ele não tem conhecimento sobre a situação específica da empresa, mas lembra que as dificuldades alegadas são comuns a outras companhias do ramo no Estado, que viram a oferta de gado cair depois que o Paraná passou a ser considerado área livre de febre aftosa sem vacinação, em 2021.
Até o Estado conquistar esse status, parte da oferta de animais aos frigoríficos paranaenses para abate saía de Mato Grosso do Sul e Minas Gerais, que são área livre de aftosa com vacinação – e, por isso, os animais desses Estados não podem mais entrar no Paraná. Ao mesmo tempo, muitos pecuaristas paranaenses que mantinham o gado nos Estados vizinhos nos períodos de cria e recria precisaram reduzir suas atividades por falta de terras disponíveis, o que também fez o rebanho do Paraná diminuir.
“É difícil precisar, mas acredito que essa queda tenha sido de 10% a 15%”, afirma Rezende. “E não vejo possibilidade de reversão desse quadro. A disputa por terras no Paraná é muito acirrada. A tendência é que o Estado, que já não é autossuficiente em carne bovina há mais de dez anos, compre animais de outros lugares cada vez mais”. O próprio Big Boi conta com dois frigoríficos em Mato Grosso do Sul, que estão operando normalmente, e deverá seguir abastecendo o Paraná.
Segundo a fonte da Secretaria de Desenvolvimento Econômico, a companhia disse aos representantes da prefeitura que vai analisar o comportamento do mercado nos próximos 90 dias para só então decidir seus próximos passos. “Caso a situação seja favorável, voltarão a contratar”, afirmou.
A fonte relatou que o Big Boi tem grande peso na geração de empregos e recolhimento de impostos na cidade. “A notícia nos preocupa porque as políticas públicas municipais podem sofrer com a queda da arrecadação”, disse. Com capacidade de abater 700 animais por dia, a planta é a terceira maior do Estado.
Fonte: Valor Econômico.